Era Natacha, agora é Ana Paula

Quando leu Guerra e Paz, meu pai descobriu toda a família nas personagens de Leon Tolstói, mas quem ele tinha mais certeza de estar perfeitamente descrita nas palavras do russo era eu: Natália Rostov, a Natacha. De acordo com ele, apesar de toda a elegância e comportamento exigido das damas, Natacha era irrequieta, corria de lá pra cá quando era pequena e, mesmo quando adulta, fazia o que queria com toda a energia. Apesar dos olhares de reprovação, ninguém jamais conseguiu realmente se irritar com ela, todos a adoravam. Por essas e outras, meu pai passou a me chamar de Natacha.
Depois de anos, tomei coragem e fui ler um dos mais longos livros já escrito. Absolutamente fantástico. E odiei concordar com meu pai, mas realmente eu me reconheci em Natacha. Pelo menos em sua fase infantil. Ler Guerra e Paz fez com que eu me lembrasse de muitos pontos adoráveis da minha infância, e mesmo dos xingões que recebia por causa das minhas estripulias. Me deu saudade. Especialmente depois que percebi o quão longe estou de ser Natacha nos dias de hoje.
Me aconteceu o inverso da música do Capital Inicial, de irrequieta e, certa forma, rebelde, acabei virando uma igual às outras, quieta demais, sossegada demais, cansada. Envelheci trinta anos em dez, talvez. Como? Sabe-se lá. Entender a razão pela qual sempre me chamavam atenção é uma das explicações, outra pode ser que realmente fui convencida de que era mesmo uma praga. Ou pode apenas ser um modo de se esconder na multidão: ficar quieta. 
Agora acostumei. Não vejo mais razão pra ficar andando de um lado a outro, o que, de certa forma, me é tedioso e pacífico ao mesmo tempo. Virei, acho, Maria Bolkonskaya, que escuta as críticas desmerecidas em silêncio, mas ainda se importa com quem as faz, dizendo a si mesma que ele não sabe o que diz. Aguardo, quem sabe, um Nicolau, que não enxergue todas as podridões, que, no fim das contas, me convenceram que tenho. 
Ou, talvez, apenas aguarde, sem saber ao certo o quê.

2 comentários:

Pandora disse...

Tenho um amigo que sempre me diz para ser inquieta, ele diz que os inquietos caem para cima e que nós somos uma multidão em um! Se inquiete Ana, aceite quem vc é e viva com isso. Não se deixe levar pela multidão, seja vc!!!

Allyne Araújo disse...

Acho q o fundamental é o equilíbrio. Natasha do Capital não sabia bem o que era uma identidade, a raiva dela se dava pelo fato de querer se revoltar contra tudo e contra tudo, sem pensar nas consequências disso, e será que haviam motivos sérios para tal?.. Por um lado é incrível, mas por outro não tem sentido algum. As pessoas querem criar raízes, saber q pertencem a alguma coisa ou lugar, isso é natural. Agora uma coisa q de fato vale a pena é manter e conciliar nossos vários Eu's ao longo da vida é aceitar q mudamos.Isso pra mim é o importante. Belo texto Ana! adorei!!!