Angústia


A água atingia seu rosto. Em outros tempos, acharia aquilo desconfortável, mas agora pouco ligava. Aliás, agora sentia um certo prazer. Mesmo que a água estivesse quente, podia ver o vapor subir por sobre o box do chuveiro, seu corpo se encolheu. Conscientemente ou não, manteve-se assim, enquanto em sua mente surgia uma lembrança incerta de alguém ter-lhe dito ser possível se afogar no chuveiro. Na época, ria da ideia. No momento, não só acreditava como desejava que isto acontecesse.
Riu desse desejo. Uma risada de menosprezo. “Não teria tanta sorte”, disse consigo. Desligou o chuveiro, mas manteve-se no lugar, ainda com o corpo encolhido. Depois de instantes, sacudiu a cabeça, pegou uma toalha, secou-se e vestiu-se. No armário de remédios pegou pelo menos um de cada tipo de comprimido que pudesse lhe acalmar os nervos, o corpo e a alma.
Jogou-se na cama e relembrou os últimos dias. Relembrou a primeira vez que vira olhos vazios de verdade, quando percebeu que até aquele momento não soubera o que os escritores queriam dizer. Sentiu o nó na garganta que, um mês antes, só conhecia pelos livros, mas que agora o acompanhava sempre. Chorava. Queria que o nó desatasse, que os problemas acabassem. Queria dormir.
E antes que percebesse, sua voz emitia sons. Demorou um pouco até perceber que eram palavras. Ah, sim, falava com Floriano Cambará. Ele havia tido seus problemas também, afinal. Talvez pudesse aconselhá-la. Riu de si mesma. Falava com um personagem que nunca existiu. Talvez fosse o alterego de Veríssimo, mas mesmo este já não existia. Encolheu-se. Podia não ouvir respostas, mas as sentia. Floriano a ajudava. Gostaria que ele fosse real, que estivesse ali. Gostaria de ajuda. 
Não sentira o nó na garganta sumir, mas ele agora parecia ter reaparecido com mais força. Tal como as lágrimas em seus olhos. Quando tudo aquilo acabaria? Já não aguentava. Não sabia até quando agüentaria. Chorava, tremia, encolhia. Chorava. Floriano não estava ali, mas precisava fingir, precisava que alguém estivesse ali. 
Sorriu sem ânimo. Sempre se orgulhara de seu desapego em relação às pessoas, no entanto, naquele instante, nada lhe agradaria mais do que ter alguém em cujo ombro pudesse chorar. Apenas as pessoas envolvidas poderiam resolver os problemas que a angustiavam, porém não era de soluções que precisava, ela simplesmente precisava de consolo, de compreensão, de carinho. Encolheu-se e chorou mais e mais até que seus olhos finalmente se fechassem.

1 comentários:

Pandora disse...

As segundas são sempre dias ruins para mim e a angústia e a solidão começam a ser minha companhia!!! rsrs

Parece que ontem os textos publicados por você e pela Gabriele resolveram dialogar, vou deixar o link Ana http://emquantos.blogspot.com.br/2012/06/drama-de-segunda.html caso você queira conferir!!!

Dizem que dia de nada é vespera de tudo se esse texto falar de algo que vc sentiu espero que o ditado seja verdadeiro, se não digo que me identifico, exceto pelo fato que meu banho é quase sempre frio.
_____

Ei, esse texto é uma reedição lá do Algo mais...? Tenho a impressão que já li ele ou algo parecido!!!

Cheros Ana, te cuida!!! Ah, desculpa a farrapada do domingo, não vai mesmo acontecer de novo!!!