Amor e riso


“Amor e riso” fora a resposta de Eric ao ser questionado sobre o que era mais importante em sua vida. Aquele pequeno ser de sete anos de idade possuía a sabedoria dos grandes e que, entre a vida e a morte, elegeu os sentimentos como seus grandes aliados à luta contra o câncer. Em mãos eu carregava uma câmera e diante de tal frase as senti tremer e os olhos que até então somente marejavam insistiram em me fazer chorar.


Fui apresentada à história de Eric através de Dra. Cassie, oncologista e besteirologista, quando o mesmo tinha cinco anos e já imputava uma personalidade forte e com respostas perspicazes a cada pergunta astuta que eu o fazia. As primeiras frases que Dra. Cassie me apresentou ao me iniciar no grupo dos “Doutores da Alegria” ficaram subjetivas: “quando a alma padece, o corpo vira carcaça”. E disse-me carinhosamente ao final: “eu cuido do receptáculo e você os alegrará até a alma”. Palavras cujas permaneceram perambulando pela minha imaginação durante dias até que fosse possível entendê-las.


Nas primeiras visitas eu mal conseguia encarar a todos os pacientes com naturalidade. Meu riso era forçado, porque eu não me sentia a vontade ao vê-los entubados, muitas vezes com uma pequena penugem cobrindo-lhes a cabeça e prostrados sobre a cama. Seus olhos aspiravam à tristeza, mas a cada entrada dos tais doutores com seus narizes obtusos e vermelhos aos quartos de recuperação, neles podiam ser vistos a esperança e nos lábios os sorrisos e as gargalhadas mais sinceras que eu podia decifrar e conhecer.


Alguns quando adentraram o recinto poderiam dar-se por vencidos, antecipando o seu fim. Porém a força que emanava quando os risologistas invadiam o hospital era a injeção de ânimo que cada um precisava – fosse paciente, médico ou familiar. Os corpos deles estavam fracos, porém as almas estavam encantadas. Seus corações enchiam-se de pulsante adrenalina e os deixavam fascinados sobre as novas formas de afeto que recebiam.


Naqueles anos de doutora da alegria, presenciei últimos suspiros, palavras e despedidas. Emocionei-me com as vitórias e com as histórias que acompanhei. Porém Eric, em especial, me mostrou que as pessoas podem doar, se doar, até de forma singela como em “amor e riso”. Uma via de mão dupla, onde quem doa também recebe sem perceber. Que a bondade mora no lado esquerdo do seio de cada ser, basta descobri-lo e demonstrá-lo, pois não é um ato que se deve temer.


Só enquanto eu respirar vou me lembrar de você. 
♪ O Teatro Mágico - O Anjo Mais Velho

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Postado originalmente no Ella en Palabras, 07/04/2011.

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